O tempo e o cabelo.

Há algo muito errado no meio disto tudo. Algures no tempo, houve um equívoco qualquer que me escapou.

Hoje de manhã, como todos os dias, passei em frente ao Estádio da Luz a caminho da escola do meu filho. Sempre que é dia de jogo, gosto de olhar as bandeiras que àquela hora já foram hasteadas nos mastros defronte da porta principal: a bandeira da UEFA, a bandeira nacional, a bandeira do Benfica e a bandeira do país de origem do clube que vem cá jogar.

É admirável como, às 9h da manhã, já se consegue sentir no ar aquele fervilhar mudo que antecede um grande jogo de futebol. O grande monstro vivo que é um estádio de futebol já está a respirar. A ser preparado desde muito cedo. Lá dentro repintam as linhas, aparam a relva, verificam as redes. Cá fora, preparam-se as barreiras de segurança, varre-se o chão, afixam-se avisos.

Mas hoje de manhã, ao passar por lá, não senti o que deveria ter sentido. Reparem, hoje jogou-se no Estádio da Luz uma meia-final duma Competição Europeia. Uma meia-final duma Competição Europeia, vale a pena repetir! Podia dizer que já não me lembro da última vez que o Benfica jogou uma meia-final duma Competição Europeia mas lembro. E foi há uma carrada de anos. Ainda era praticamente um puto e lembro-me que muito pouca coisa nos dias que antecederam aqueles jogos foi para mim mais importante que o Benfica e a sua meia-final europeia. Comer e dormir não o foram com certeza. O meu mundo parou na expectativa daqueles 90 minutos mágicos.

Hoje não. Entre outras coisas porque uma meia-final contra o Sporting de Braga não lembra ao careca. Aliás, por falar nisso, de lá para cá houve tempo para eu próprio ficar careca e tanta coisa mudou entretanto! O Benfica já não é mandão. Já não é "quem manda aqui". Nem na Luz. Já não impõe o respeito de outras eras. Principalmente em Portugal. Particularmente do Mondego para cima.

Em conversa com um amigo meu, chegámos à conclusão de que teria sido mais mágico, mais "europeu" e por ventura até mais fácil para o Benfica ter jogado esta meia-final com o Marselha, o PSV, o Milan, o Dnyepr até mesmo com o Raio-que-o-parta-para-lá-de-Vilar-Formoso-Futebol-Clube!

Internamente a nossa moral está um farrapo e tremem-nos as pernas por antecipação. Agora vamos jogar a Braga com medo do que possa acontecer e, como se isso não bastasse, já psicologicamente esmagados - só naquela, para uma qualquer eventualidade de chegarmos à final - com uns 5-1 alheios a pairarem-nos em cima da cabeça como uma grande núvem negra.

Olho para trás e vejo como tanta coisa mudou desde a última vez. Muita. E certamente que o meu penteado não foi a mais relevante delas.